sábado, 4 de dezembro de 2010

A estrada...

Como eu estava te falando... Vivo na estrada, mas não tenho pressa. Aceita um café?

Sim, um café... a bebida dos deuses!

Garçom, dois cafés, por favor!

Mas voltemos à estrada. Você disse que ouviu alguém falar que é um lugar perigoso? MENTIRA!!!

A estrada é o lar dos nômades, dos errantes, de todos aqueles que se movimentam. As pessoas não estão acostumadas ao movimento. Por mais que seus dias sejam movimentados, transitam sempre pelos mesmos lugares. A intensidade do movimento pode ser grande, mas a rota é mínima. Por isso têm medo da estrada. Ela é ampla. Pode ser estreita e sinuosa, mas é longa. Essa amplidão gera incertezas. A dúvida do que estará para além da próxima curva. E é disso que as pessoas se assustam.

Sabe, tenho receio das certezas. As dúvidas me tranquilizam. Acho que nasci para a estrada como a lua nasceu para o céu estrelado.

Opa, aqui está o café. Prove!

Então, não há o que temer na estrada quando se está disposto a ser surpreendido. Basta estar preparado para o novo, para o diferente, para a surpresa. E isso é fascinante!

Na estrada não existe rotina senão se movimentar. Essa é a única regra: movimente-se.

Dia desses encontrei um senhor caminhando na mesma direção que eu. Diminuí meu ritmo para poder acompanhá-lo. Foi gratificante estar ao lado daquele velho sábio. Penso que aprendi muito com ele. Quando a estrada atingiu uma serra, ele preferiu parar na cidadezinha mais próxima. Ficou ao pé daquela serra, imaginando o que teria deste outro lado. Por diversas vezes confessou ter curiosidade em saber onde a estrada terminaria. Para ele, terminou naquela serra. Enquanto eu subia a serra, me distanciando dele, olhava para trás algumas vezes e percebia a figura do velho, sentado, olhando em minha direção. Apenas acenava e ele retribuía.

Não tentei convencê-lo a me acompanhar, tampouco insisti para que prosseguisse. Você sabe dos seus limites, dos seus sonhos e suas ambições. Acredito que ele também sabia. Não posso determinar o que alguém deve ou não fazer. Mal dou conta de fazer isso por mim.

Depois disso, encontrei um grupo de pessoas andando na direção contrária. Não sei se voltavam, ou apenas se a direção deles era oposta a minha e rumavam do mesmo jeito que eu. Não tive vontade de perguntar. Apenas os cumprimentei, por educação. Mas pareciam animados.

Para mim, a estrada não tem direção definida. Não sei se ela começou da nossa esquerda para a nossa direita, ou o contrário. Sei que eu a percorro nessa direção.

Um momento... Garçom, mais dois cafés, por favor.

Sabe, foi bom ter encontrado você nesse trecho. Pelo menos me apresentou um bar, com um excelente café. Além de me ouvir. A estrada faz isso com a gente. Como andamos sozinhos boa parte do trecho, quando encontramos alguém, começamos a falar e não paramos mais. Ainda bem que você tem paciência.

Às vezes, ao longo da estrada sinto um pouco de solidão. Para alguns isso pode ser ruim, mas eu gosto. Gosto de ficar comigo mesmo. É nessas horas que eu consigo pensar se vale a pena continuar, se é melhor parar por aqui mesmo, ou, ainda, se o melhor a fazer é voltar. Até agora esses momentos de solidão me mostraram que vale a pena continuar em frente. Eu nem chamo de solidão. Para mim são momentos comigo mesmo.

Tem horas em que é preciso andar depressa. Quando isso acontece, não tenho muito tempo para aproveitar o caminho. Esqueço por um tempo o que ficou para trás. E nessas horas, sozinho, aproveito para lembrar tudo o que passou e pensar no que ainda está por vir. Sinto muita falta de pessoas, de momentos, de coisas que ficaram no caminho. Mas se tem algo que eu aprendi a respeitar é o destino.

Sabe, as coisas não acontecem por acaso. As pessoas não entram ou saem das nossas vidas à toa. Isso não significa aceitar passivamente o que acontece, pelo contrário, significa aproveitar intensamente o que acontece. Se for para chorar, que seja um choro sincero, derramado, verdadeiramente chorado. O mesmo se for um sorriso, que seja intenso, gargalhado, curtido.

Enfim, a estrada não é perigosa assim como a vida não é difícil para quem sabe viver.Nós tornamos a estrada assustadora em função dos nossos próprios medos. Assim como tornamos a vida difícil por causa das nossas preocupações [muitas vezes infundadas].

Mas já está ficando tarde. É melhor irmos descansar agora, amanhã teremos um bom trecho para enfrentar. Conversamos mais no caminho.

Ahh!!! Já ia esquecendo. Você me chama quando acordar? Nunca fui bom em sair da cama...

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